Ásia Continental
Os conflitos armados, os raptos, as detenções arbitrárias e as novas leis que restringem os direitos continuam a minar o espaço cada vez mais reduzido da liberdade reli- giosa na Ásia continental. Abrangendo a Coreia do Norte, a China, o Laos, a Índia, o Bangladesh e o Vietname, a re- gião inclui alguns dos maiores e mais populosos países do mundo, albergando numerosas comunidades religiosas e étnicas, e é palco de algumas das piores violações da li- berdade religiosa do mundo.
Repressão totalitária e controlo sistemático
A liberdade religiosa na China continua a sofrer sob o Governo do presidente Xi Jinping, à medida que o Parti- do Comunista Chinês (PCC) intensifica a sua política de sinicização, visando alinhar todas as tradições religiosas com a ideologia socialista. As Medidas de 2023 sobre a Ad- ministração dos Locais de Actividades Religiosas e a Lei da Educação Patriótica impuseram requisitos rigorosos às comunidades religiosas para promover os valores so- cialistas fundamentais.136 Todos os locais religiosos estão agora sujeitos a avaliações estatais e proibidos de acolher actividades consideradas contrárias aos interesses na- cionais. A repressão de grupos religiosos não registados aumentou, com relatos generalizados de detenções, pri- sões e encerramento de locais de culto. Foram condena- dos clérigos por acusações vagas, como "fraude" ou "sub- versão", e o conteúdo religioso na internet continua sob forte censura.137 Em Xinjiang, as medidas introduzidas em 2024 exigiram que todos os novos edifícios religiosos re- flectissem “características chinesas”, um sinal de esforços acelerados para apagar a identidade religiosa e cultural uigur.138 Mais de 600 aldeias uigures foram renomeadas, e as pessoas continuaram a enfrentar uma vigilância inten- sa, detenções arbitrárias e castigos por se envolverem em práticas religiosas.139
A Coreia do Norte continua a ser um dos regimes mais repressivos do mundo. Embora a Constituição garanta a liberdade de crença, esta é anulada por uma ideologia es- tatal que exige lealdade absoluta à dinastia Kim. Qualquer expressão de crença religiosa é considerada uma ameaça directa à autoridade do Estado. Os indivíduos descobertos com materiais religiosos ou acusados de participar em ac- tividades religiosas não autorizadas enfrentam punições severas, incluindo tortura, prisão perpétua ou execução. A política de repatriamento forçado da China agravou ainda mais a situação dos desertores norte-coreanos.
Aqueles que regressam à Coreia do Norte são com fre- quência sujeitos a punições severas, incluindo trabalhos forçados, ou são mesmo executados.140
No Vietname, as minorias religiosas como os Cristãos montagnard e hmong, e os Budistas khmer-krom enfren- tam uma pressão constante, especialmente no Planalto Central. As autoridades interromperam cultos, demoliram locais de reunião e pressionaram indivíduos a renuncia- rem à sua fé.141 Os membros de grupos não registados são frequentemente detidos sob acusações vagas de ameaça à segurança nacional.
Da mesma forma, no Laos, a perseguição religiosa per- siste, apesar das protecções constitucionais. Em 2023- 2024, os Cristãos foram expulsos de aldeias como Mai e Sa Mouay por se recusarem a abandonar as suas crenças. Foram demolidas igrejas e detidos pastores, por vezes du- rante semanas, sem acusações. Em Julho de 2024, o Pas- tor Thongkham Philavanh foi assassinado, o que põe em destaque os riscos enfrentados pelos líderes cristãos nas zonas rurais.142
Nacionalismo apoiado pelo Estado e restrições à liberdade religiosa
Em Mianmar, o poder político, a identidade étnica e a filiação religiosa estão profundamente interligados, in- fluenciando tanto a dinâmica do conflito civil em curso como a progressiva erosão dos direitos fundamentais. Embora a guerra actual não seja inerentemente religio- sa, tem piorado significativamente as condições para a liberdade religiosa. A junta militar tem sido associada a uma agenda nacionalista budista14 que é intolerante para com grupos étnicos não bamar e grupos religiosos não budistas, associando-os frequentemente a movimen- tos de resistência étnica ou a actores da sociedade civil. Os locais religiosos são atacados com frequência, pois servem muitas vezes como centros de vida comunitária e de assistência humanitária. Desde o golpe de 2021, cen- tenas de igrejas, incluindo católicas, foram bombardea- das ou incendiadas.144 Os líderes religiosos foram mortos, presos ou intimidados. A Constituição de 2008 continua em vigor, atribuindo ao Budismo uma "posição especial" e codificando leis discriminatórias sobre a conversão e o casamento inter-religioso.145 Os Rohingya continuam a enfrentar atrocidades e deslocações forçadas.
No Sri Lanka, a influência do nacionalismo budista cinga- lês, particularmente na Província Oriental, levou a um au- mento da vigilância, do assédio e da pressão legal sobre as minorias religiosas. A Lei do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (PIDCP) e a Lei de Prevenção do Terrorismo têm sido utilizadas para combater vozes dissidentes.146 Os Hindus tâmiles relatam apreensões de terras, enquanto os Cristãos e os Muçulmanos são regu- larmente intimidados. Embora o país tenha vivido uma estabilização política, a resistência do Governo à monito- rização dos direitos humanos prejudica a responsabiliza- ção e a confiança.
Perseguição híbrida e intolerância legalizada
Na Índia, as garantias constitucionais de liberdade reli- giosa são minadas pelas políticas nacionalistas hindus promovidas pelo Partido Bharatiya Janata (BJP). Desde 2014 têm sido impostas restrições crescentes às comu- nidades muçulmana e cristã. A Lei de Regulamentação de Contribuições Estrangeiras (FCRA) tem sido utilizada para suspender ou cancelar as licenças de ONG ligadas a minorias religiosas. Em 2024, das mais de 35.000 ONG apenas 15.947 permaneciam autorizadas a receber finan- ciamento estrangeiro.146 Já existem leis anticonversão em 12 estados,148 incluindo Rajastão e Uttar Pradesh, onde as disposições permitem que qualquer cidadão apresente queixas, o que aumenta o risco de falsas acusações.
A violência religiosa aumentou, com os Cristãos a sofre- rem um recorde de 834 ataques em 2024, particularmente em Uttar Pradesh e Chhattisgarh, envolvendo agressões de multidões.149 Em Manipur, os confrontos intercomuni- tários entre as tribos cristãs Kuki-Zo e os grupos hindus Meitei causaram dezenas de mortes e destruição genera- lizada.150 A Índia é agora um exemplo de um modelo de "perseguição híbrida", que combina a repressão jurídica com a violência popular.
No vizinho Nepal, as disposições anticonversão na Cons- tituição levaram à perseguição das comunidades cristãs. Pastores e leigos foram presos ou humilhados publica- mente, especialmente quando acusados de converter dalits.151 Em Setembro de 2023, activistas hindus inter- romperam um encontro cristão em Kharhni, dispensaram os participantes e mancharam os rostos de dois pastores com tinta preta.152 Uma semana antes, um casal de mis- sionários indianos foi entregue às autoridades. Em Agosto de 2024, uma igreja em Dhanusha foi encerrada sob alega- ções de "conversões em massa".153
Instabilidade pós-transição e tensões religiosas
O Bangladesh mantém princípios ambíguos, nomeando o Islão como religião de Estado e, ao mesmo tempo, de- fendendo o secularismo como valor constitucional. Na prática, esta dualidade tem fomentado a instabilidade e a discriminação. A Lei da Cibersegurança,154 adoptada em 2023, permitiu que se continuasse a reprimir a dissidência e a visar grupos minoritários.
Após a saída da primeira-ministra Sheikh Hasina, em 2024, e a instalação de um Governo interino liderado por Muhammad Yunus, as comunidades minoritárias têm reportado um aumento da violência e da discriminação. O levantamento da proibição do Jamaat-e-Islami gerou preocupações com a crescente influência islâmica.155 Nas colinas de Chittagong, as comunidades cristãs têm sido alvo de assédio direccionado, enquanto a situação dos re- fugiados rohingya continua precária e sem solução.