Ásia Marítima e Pacífico
A região marítima da Ásia-Pacífico abrange a Península Malaia, o Arquipélago Malaio, a Austrália, a Nova Zelândia e as nações insulares do Indo-Pacífico. Esta vasta e estrate- gicamente importante região inclui algumas das socieda- des com maior diversidade religiosa do mundo, bem como áreas onde o Islamismo militante e a ortodoxia religiosa imposta pelo Estado continuam a restringir gravemente a liberdade religiosa ou de crença.
Malásia e Maldivas: repressão islâmica institucionalizada
A Malásia e as Maldivas, onde as ideologias sunitas islâmi- cas exclusivas estão inseridas na lei e na governação, conti- nuam a ser os países mais repressivos da região em termos de liberdade religiosa.
Na Malásia, inúmeros incidentes durante o período deste relatório ilustraram restrições persistentes e tensões in- tercomunitárias. Indivíduos, incluindo um comediante de stand-up e um comerciante de Johor, foram acusados de alegadamente insultar o Islão,170 enquanto uma mãe expressão continuam a afectar desproporcionalmente os não muçulmanos, especialmente os Cristãos. Um homem de 74 anos, convertido ao Catolicismo, permaneceu detido por blasfémia em Dezembro de 2023, três anos depois de ter publicado um livro crítico do Islão.180
Nas Maldivas, as leis que proíbem a expressão religiosa não islâmica continuaram a ser rigorosamente aplicadas. Dois turistas alemães foram detidos em 2024 por distribuir Bíblias.176 Um líder espiritual indiano e o seu assistente fo- ram deportados em 2023.177 As Maldivas serviram também como campo de recrutamento para grupos extremistas, e 20 indivíduos foram sancionados pelos Estados Unidos, em 2023, por financiarem o autoproclamado Estado Islâmico e a Al-Qaeda. As prisões funcionam, supostamente, como centros de radicalização.178
Indonésia: contradições entre blasfémia e unidade
Desde a independência em 1945, a Indonésia é oficialmen- te um Estado laico e reconhece o direito à liberdade reli- giosa. No entanto, a sua longa tradição de pluralismo tem sido posta à prova. A única província governada pela sharia é Aceh, e em Janeiro de 2023, na sua capital, Banda Aceh, uma mulher recebeu publicamente 22 chicotadas por se ter encontrado com um homem que não era o seu marido.179 As leis contra a blasfémia e as restrições à liberdade de solteira foi condenada por khalwat, o crime de estar em proximidade física com um homem que não era o seu marido nem um parente próximo do sexo masculino.171 Em 2024, a deputada católica Teresa Kok foi questionada após criticar o custo da certificação halal.172 Em Sabah, os Cristãos foram registados arbitrariamente como muçul- manos em documentos de identificação,173 enquanto os refugiados rohingya enfrentaram discriminação étnica e doutrinária.174 O debate público em Sarawak sobre as au- las de estudo da Bíblia e a xenofobia revelou a fragilidade da coexistência religiosa.175 Apesar de algumas decisões judiciais que defenderam os direitos das minorias, o clima manteve-se marcado por ambiguidade jurídica, vigilância estatal e crescente intolerância.
Em Setembro de 2024, o Papa Francisco visitou a Indonésia no início da sua viagem por quatro países do Sudeste Asiático. Exortou o país a defender o seu lema, “Unidade na Diversidade”, e a ser um modelo de coexistência inter-religiosa.181 O Papa terminou a sua viagem pela Ásia-Pacífico com uma visita de três dias a Singapura, elogiando o compromisso do país com a harmonia religiosa e a sua protecção da liber- dade religiosa para todas as religiões.181
Filipinas e Brunei: extremismo localizado e governação pela sharia
A violência jihadista persistiu em Mindanao, a ilha a sul das Filipinas com uma grande população muçulmana. Em Dezembro de 2023, uma bomba foi detonada duran- te uma Missa católica na Universidade Estadual de Min- danao, matando quatro pessoas.183 Em Maio de 2024, um ataque com granada a uma capela na cidade de Cotabato feriu duas pessoas.14 Conflitos armados entre militantes islâmicos e forças governamentais em Maguindanao del Sur fizeram 11 mortos.185 Estes acontecimentos realçam a ameaça contínua representada pelos actores jihadistas na região de Bangsamoro. Ao mesmo tempo, foram levantadas preocupações sobre a forma como o Governo tem utilizado a controversa Lei Antiterrorismo para encobrir abusos dos direitos humanos, incluindo ataques a activistas, líderes re- ligiosos e comunidades indígenas que procuram proteger as suas terras dos interesses mineiros.
Apesar das críticas internacionais, o Brunei continua a manter a Ordem do Código Penal Syariah (SPCO), que en- trou em vigor em Abril de 2019. Esta estrutura legal crimi- naliza a apostasia, a blasfémia e a propagação de religiões não islâmicas, prescrevendo punições como a amputação, a flagelação, o apedrejamento e a pena de morte, embo- ra se mantenha em vigor uma moratória de facto sobre as execuções.186 Os não muçulmanos enfrentam restrições significativas, principalmente em relação ao proselitismo, à distribuição de materiais religiosos e à formulação de declarações críticas sobre o Islão, apesar das disposições constitucionais que garantem a liberdade de religião.
Pacífico e Austrália: liberdade religiosa no meio de novas tensões
Ao contrário de muitos dos seus vizinhos, os países insulares do Pacífico — incluindo a Austrália, a Nova Zelândia, Timor- -Leste e a Papua-Nova Guiné — mantêm geralmente fortes protecções da liberdade religiosa. O mesmo se aplica aos microestados do Pacífico como Samoa, Tonga, Fiji e Kiribati.
Na Austrália, a liberdade religiosa foi legalmente protegida no passado, mas episódios recentes têm levantado preocu- pações. Alguns estados exigem que os profissionais de saú- de religiosos disponibilizem ou encaminhem serviços que possam entrar em conflito com as suas crenças, e um esta- do confiscou um hospital católico que não disponibilizava serviços de aborto. A utilização contínua de centros de de- tenção offshore pela Austrália, particularmente em Nauru, tem sido alvo de críticas internacionais. Os grupos de defesa dos direitos humanos e os bispos católicos condenaram as condições locais como desumanas. Muitos requerentes de asilo, muitas vezes em fuga de perseguição religiosa, per- manecem em detenção prolongada. Em Novembro de 2024, mais de 100 pessoas estavam detidas em Nauru, o número mais elevado desde 2013.187
Na Papua-Nova Guiné, a agitação interna e a pressão geopolítica têm acirrado o debate sobre o papel da religião na vida pública. Após tumultos mortais em Fevereiro de 2024, o primeiro-ministro James Marape promoveu uma identidade nacional cristã. O Parlamento aprovou logo um projecto de lei que declarava a Papua-Nova Guiné um país cristão, provocando alertas dos líderes religiosos sobre o enfraquecimento da diversidade cultural. Durante a sua visita em Setembro de 2024, o Papa Francisco apelou ao respeito pela dignidade humana e denunciou a violência, incluindo abusos relacionados com bruxaria. A crescente politização da religião e as influências externas podem ameaçar a liberdade religiosa e o pluralismo no país.188